segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

segunda-feira, 5 de julho de 2010

A misteriosa canção "real"...


Nos disputados shows da turnê em que celebrou seus 50 anos de carreira, Roberto Carlos faz uma pausa logo após a orquestra do maestro Eduardo Lages executar os últimos acordes de Caminhoneiro. O Rei permanece quieto por uns instantes enquanto o público, principalmente o feminino, teima em quebrar o silêncio: Robertoooo! Você é tudo!. Num tom de voz mais baixo que o habitual, o intérprete recomeça o espetáculo com uma explicação: Gostaria de ter escrito somente canções sobre amores bem-sucedidos, mas a vida não é assim. Esta eu compus num momento de muita tensão, a coisa estava realmente brava. Em seguida, apresenta Do fundo do meu coração.

A música, pouco conhecida, descreve o fim dramático de um relacionamento afetivo: Vi todo o meu orgulho em sua mão/ Deslizar, se espatifar no chão/ Vi o meu amor tratado assim/ Mas basta agora o que você me fez/ Acabe com essa droga de uma vez/ Não volte nunca mais para mim. Quando Roberto termina de cantar, boa parte da plateia se pergunta: para quem, afinal, ele escreveu a letra? O artista, no entanto, esquiva-se de desvendar o mistério.

Feita em parceria com Erasmo Carlos, Do fundo do meu coração integra um dos vários álbuns que levam o nome do "Rei", o de 1986. Geralmente, os discos do cantor reúnem o repertório criado ao longo dos dois anos que antecedem a gravação. Tudo indica, portanto, que a composição seja de 1984 ou 1985.

Na época, Roberto ainda estava com a atriz Myrian Rios. Eles se conheceram em 1979 e ficaram juntos até 1989. Sabe-se que, para a então companheira, o "Rei" fez Símbolo sexual e outras odes do gênero. Será que também se inspirou nela quando concebeu a música enigmática? O casal teria brigado naquela ocasião?

O historiador Paulo Cesar de Araújo - autor de Roberto Carlos em Detalhes, a biografia que a Justiça impediu de circular por solicitação do próprio "Rei" -, manifestou especial interesse pela música enquanto redigia o livro. Pesquisei muito e cheguei à conclusão de que a letra não se baseia em fatos reais nem condiz com o período bom que o cantor e Myrian atravessavam.

Bom, destinada à Myrian Rios ou não, trata-se de uma canção cuja estética é um primor.

Por Sheyla Miranda.
Adaptações: Murillo Pompermayer.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Aniversário "real"...


Há 69 anos, o dia 19 de abril se tornou um dia especial na folha do calendário de cada um de nós. Vem a comemoração de mais um ano que passamos juntos ao lado de Roberto Carlos, o maior cantor popular do Brasil. Só quem acompanha RC sabe que palavras como Emoções e Detalhes ganham dimensões diferentes, são somente um verbete de onde são desenroladas linhas melódicas e letras escritas com delicadeza e simplicidade. Afinal, Roberto Carlos é um artista paradoxal. Um "Rei" aclamado pelo povo, mas um "Rei" que não aceita o título com soberba, um "Rei" que só aceita o "epíteto" como um carinho, um carinho de amigo.

Aliás, um carinho de amigo de fé e de irmão camarada, que um dia disse que queria ter um milhão de amigos. Mas que de repente passou a casa do milhão e chegou aos milhões de amigos. Milhões de pessoas que viram na sensibilidade de um artista a capacidade de ele ser perfeito em todas as suas imperfeições. Roberto Carlos tem os erros de seu português ruim, pois, como diz Nelson Rodrigues, não acredito em brasileiro que não tenha erro de concordância. Mas ele sabe acertar cuidadosamente as palavras, até mesmo as palavras que ele não sabe dizer.

Em letra e música, o universo inteiro viu até onde o amor é capaz de chegar. Da loucura de um amor em descoberta, passando pela sensualidade entre quatro paredes até chegar à serenidade de um amor sem limite. Amor que vai além dos horizontes de um casal. Amor à natureza, à fé, aos filhos, aos amigos. Todos nós começamos a nos sentir filhos do seu Robertino, e graças a ele passamos a chamar nossos pais de meu querido, meu velho, meu amigo. Todos nós passamos a ter vontade de ser novamente um menino, e de chamar carinhosamente nossa mãe de Lady, como foi com Lady Laura.

Hoje começam os 69 anos de vida de Roberto Carlos. Festa um pouco mais triste, pois da estação partiu o trem que leva Lady Laura. Ela não pôde continuar na festa de RC. Mas, sem dúvida, todos nós estamos aqui hoje para abraçar bem forte o aniversariante. Cada um de nós sabe que um fã tem toda sinceridade quando deseja muitas felicidades e muitos anos de vida para o artista que admira há muito, muito tempo.

Por Vinícius Faustini.

sábado, 2 de janeiro de 2010

1972: de fato conceitual?


Há quem questione sobre o fato de o disco de 1972 ser conceitual ou não. Obviamente, é.
Um disco conceitual, como o próprio nome caracteriza, gira em torno de uma idéia, de um conceito artístico. Produto típico do final dos anos 60 e dos anos 70, tem elementos artísticos sintonizados com o conceito que vão desde a capa. Enfim, estranhamente para quem considerar a postura que adotou hoje, em 1970, 71, 72, Roberto Carlos estava querendo se deitar no divã e dividir com seu público todas as suas questões existenciais. Tendo uma história de vida muito rica em detalhes, com uma pitada até grande de sofrimento, o material que tinha era farto.

Não acredito que ele tenha composto esse material de uma só levada, tanto que o disco de 71 já tinha Traumas e acenava para esse caminho. Mas, para o disco de 1972, ele tinha um bom material, que permitiria a construção desse disco. A produção de um trabalho assim envolve toda uma máquina. Uma gravadora, com seus executivos, A&Rs, arranjadores, produtores, etc. E Roberto tinha Evandro Ribeiro, que o ajudou a construir esse trabalho.

Vamos às palavras do jornalista e crítico musical, Pedro Alexandre Sanches: Quem comprasse o RC versão 1972 nas lojas decoradas de Natal teria a impressão de estar levando Jesus Cristo para casa. Vinha ornado por uma das mais belas e pungentes imagens de capa de disco que o Brasil deve ter sempre conhecido. Novamente em tons sóbrios (nesse caso, em estrito preto-e-branco), ela ostentava em close um RC de longos cabelos encaracolados, olhos fugidios deslocados para baixo e à direita e uma expressão de profunda tristeza, que ia do modo de olhar ao contorno grave dos lábios. Não havia cruz ou coroa de louros, mas era quase uma imagem sacra, um fetiche de consolo que acalmasse a alma do observador como o fariam as contas de um terço ou o ascetismo de um confessionário.

O louvor assustado de RC a Jesus construía a imagem de um espelho. Ao amar Jesus, o homem daquela fotografia amava a si mesmo, lotado de misericórdia. Ao amar a imagem límpida daquela fotografia, o consumidor daquele disco amava Roberto Carlos e Jesus Cristo, e, em imagem, amava a si mesmo, cheio de pena deles e por si. Amando-se a si mesmo, saía do anonimato e se tornava popstar, divindade religiosa, as duas coisas ao mesmo tempo. E assimilava as obrigações, culpas, dogmas, dós e medos que tal associação implicava, e que vinham expostas não só no olhar abandonado do totem, mas nas linhas musicais e textuais de todo o disco.


Olha aí: conceitual. Na minha opinião, o prenúncio dessa famosa capa está no final do filme Roberto Carlos a 300 km/h, onde, na sequência final, rejeitado pela mocinha, Roberto, ao som de De tanto amor, exibe um semblante de imensa tristeza e solidão. Alegrando-se depois pelo casamento de Erasmo e, "chaplinianamente", partindo, enquanto sobe a grua da câmera. Filmes à parte, e ampliando muito mais seu raio de ação, Roberto parecia pensar muito no ilógico, no paradoxo entre o que vivera até ali e sua situação de ídolo.

A infância pobre em Cachoeiro, a condição de deficiente físico adquirida após o famoso acidente onde foi colhido por um trem (estranho pensar que o maior símbolo sexual da história da MPB, num país que cultua o corpo além dos limites, é um amputado), a luta para se tornar cantor, a condição de ídolo de um povo reprimido pela ditadura, as rejeições, os amores difíceis, os problemas de saúde do filho... Tudo isso pesava no "Rei", naqueles tempos. Pensando bem, em 1969 ele já estava assim. Acho que o que fez Roberto sair daquela alegria e daquele "olimpo popstar" foram os problemas de Segundinho, hoje Dudu Braga, e lá estava As flores do jardim da nossa casa. E 72 foi o auge.

Neste álbum, músicas coerentes, amarradas pelo tema da confusão, da incerteza, da insegurança sobre seguir convenções sociais ou transgredir em nome da felicidade pessoal, da luta por amores difíceis, alimentada por Antônio e Mário Marcos e sua Como vai você, e, principalmente, a prova de que nem só de alegria vive o "Rei" do Brasil, "remexendo no baú" e se lembrando de um distante (ou nem tanto) 29 de junho de 1947, cuja recordação lhe vem todos os dias pela necessidade de uso de uma perna mecânica.

Todos trabalharam, nesse disco, para definir bem essa imagem. Os arranjadores americanos criaram texturas "nubladas", nuances barrocas, imagens sonoras muitas vezes cinematográficas, explicativas (O divã é repleta disso). Os engenheiros de som deixaram o disco com uma sonoridade um tanto quanto velada, "escurecendo as nuvens". E a voz? Ao contrário dos berros do passado imediato e das inflexões soul, Roberto vem cantando manso, procurando seus agudos (coisa que nunca mais faria), criando uma sensação de cantar "ao pé do ouvido" de seu público, sem se deixar alterar pela tristeza, sem espasmos (mas mostrando uma longa convivência, uma absorção a ela), faz um convite quase irrecusável a que todos lhe ouçam e prestem atenção no que queria dizer.

Enfim, tudo conspirou para que essas idéias funcionassem. A CBS trabalhou muito bem, e o produto é esse. Não é conceitual?

Por Alexei Michailowsky.
Adaptações: Murillo Pompermayer.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

O antológico álbum de 1972: as canções...


Roberto Carlos nos dá uma aula de cultura pop sem precedentes nesse disco. Trata-se de um álbum tão conceitual como vários que vinham sendo lançados, à época, no mundo todo. Ele gira em torno de uma idéia: idiossincrasias, tristeza e "confusões da mente" de um lado, e uma beleza quase infantil e ingênua do outro. Coisa meio barroca. Simboliza uma espécie de passagem para a maturidade, já prenunciada a partir do disco O inimitável, mas totalmente explícita aqui. Além da capa, onde, em preto e branco, o "Rei" exibe um semblante triste e sofrido, como um "São Sebastião moderno", o som do disco é "nublado". Não tem muitos agudos, o que lhe dá uma especial beleza sombria. Arranjos primorosos, com instrumentos que, não coincidente, evocam algo de barroco, pontuam as canções, e o "Rei", no auge da forma, faz o que quer com as canções. Analisemos este disco fabuloso, música por música.

À distância...

Música que evoca uma separação não-resolvida, um amor perdido e talvez unilateral. Romântica e sofrida, com uma grande interpretação do "Rei". Cordas muito densas no canal esquerdo, em alguns momentos até se sobrepondo à voz.

À Janela...


Música tensa, dá uma certa sensação de aflição. Vai crescendo aos poucos enquanto o "Rei", no seu lado trovador, canta sobre confusões e a vontade de sair de casa, seja a dos pais ou o lar conjugal. As cordas e madeiras criam outra "nuvem cinzenta", e em um dado momento, a música vai ficando forte e surge aquela "brechinha" de sol. A voz do "Rei" está sempre mansa, mesmo quando ele fala sobre tormentos e problemas. É como se ele expusesse o problema e, mansamente, oferecesse uma solução. Detalhe curioso: as backing vocals são americanas e cantam apenas "coisas da vida", com um sotaque muito forte. O "Rei" entoa "choque de opiniões", e elas, "coisas da vida". No segundo verso, a música tem mais leveza e movimento, com metais e o coro fazendo "wooooo"...

A montanha...

Música de fé religiosa, aparentemente simples, mas com influências de ragtime, o "avô" do jazz, e pequenas intervenções de instrumentos que dão graça ao arranjo. Em todas as entradas de verso, o tom da música sobe, e ela vai se tornando mais movimentada, iluminada, e adquire um clima de festa ou culto. No disco, a presença dessa música é emblemática, porque o Senhor surge como solução para todos os males e tormentas...

Acalanto...

O "Rei" trata da paternidade nessa canção de Dorival Caymmi. É de uma singeleza angelical impressionante, evocada pela voz feminina no início... E a voz "real" está lá, mansa, no "pé do ouvido", "embalando a criança". Talvez a paternidade recente de Luciana tenha o influenciado.

Agora eu sei...


Canção meio folk-rock com ligeiras influências de Crosby; Stills; Nash e Young; James Taylor; Bob Dylan; e outros do gênero. Destaque para o violão no arranjo, que é bem simples, e, claro, para a voz do "Rei". Detalhe interessante: os backing vocals são de Roberto, em "falsetão" mesmo. Coisa muito rara.

Como vai você...

A canção de Antônio Marcos é uma das melhores interpretações de Roberto em todos os tempos! Que sentimento ele põe! Como ele transmite o sentimento, mais uma vez, na tentativa de recuperar um amor perdido, de forma exata! O arranjo é sensacional! Cravo, violão, cordas... E a voz do "Rei" soa maravilhosamente. As nuances que ele dá (vide, sobretudo, a segunda "razão da minha paz já esquecida") são históricas. Difícil falar muito dessa obra-prima.

Negra...


Linda canção, lindo arranjo, grande interpretação do "Rei". Só que hoje em dia a temática dela soa politicamente incorreta e até meio racista. Mas em 1972 essas questões faziam sentido. Mesmo assim, Elis Regina e Marcos Valle já cantavam que "Black is beautiful"...

O divã...

Canção já muito dissecada e estudada. O único momento em que o "Rei" falará mais explicitamente sobre seu mítico acidente de infância. Cifrada, tensa, "nublada", densa, com várias imagens musicadas no arranjo, principalmente o movimento de um trem... A letra cifrada, meio confusa, voz mansa, "no ouvido", apesar de toda a dor, e aquele espírito de trova... Coisa de gênios. Desde Roberto até o engenheiro de som, passando pelo arranjador e pelos músicos, que executaram tudo com competência. Sem confusões na mente.

Por amor...

Outra música que fala de amor perdido, e do sofrimento consequente. Fala de sentimentos de culpa, orgulho, depressão pela perda do amor, desilusão, enfim. Arranjo simples, mas muito adequado, de forma a enfatizar o canto.

Quando as crianças saírem de férias...

As tormentas do pai que não pode curtir sua mulher em nome da necessidade dos filhos de receber atenção é relatada como trova por Roberto. Música bem simples, mas uma historinha bem contada. Atenção para a voz "dobrada" do "Rei" para "engordá-la".

Você é linda...

Bela, linda música que descreve a admiração do "Rei" por uma grávida anônima. Como mero observador externo, ele vai falando do que vê, do que observa... "Nuvens brancas" no arranjo, com as cordas evocando esperança, e a voz "real" novamente é terna, doce, e positiva. Uma grande interpretação de Roberto.

Você já me esqueceu...

A introdução lembra Detalhes... É, também, uma música que trata da tristeza da perda de um amor. Apesar das flautas darem uma estranha leveza a esse tema... Mais "nuvens" ao longo do arranjo. Mas estão ocultas pela "noite". A interpretação "real" é pensativa, e não tão sofrida...

Algumas curiosidades interessantes...

- Em 1972, o "Rei" não tem uma música sequer para seduzir uma mulher, e não fala de amores bem-resolvidos. Fala de amores perdidos, da tormenta, e pede voltas.

- Quando falo de nuvens, falo das nuances e imagens que a orquestra de cordas desenha nesse disco, volta e meia. Dá pra sentir o tipo de nuvem, o que ela pretende descrever, quais os movimentos, as tensões...

- Falando em tensões, esse disco oscila entre a tensão total, a expectativa de algo, e a esperança singela.

- O "Rei" adota um tom de observador em algumas faixas e, inclusive, o mistura onde está, sobretudo, em primeira pessoa: "O Divã", no caso.

- O coro soa angelical e talvez a idéia seja essa mesmo.

Por Alexei Michailowsky.
Adaptações: Murillo Pompermayer.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

A maior contribuição "real"!


O fato do "Rei" ter trazido o soul ao Brasil foi, decerto, de insólita importância, conforme fiz alusão na postagem inicial deste blog. Contudo, sua contribuição de maior relevância na música popular brasileira foi a inserção do país num universo pop. Até os anos 60, isso praticamente não existia aqui. Tudo bem, houve a Bossa Nova, que se internacionalizou a partir de 1962, mas ela foi um movimento elitizado.

Não é verdadeiro dizer que antes do "Rei" a música brasileira era "pura", porque elementos internacionais foram empregados a ela desde a "pré-história". Porém, com a Jovem Guarda, a música ficou bem mais universal. O pop tocado pela turma de Roberto não era diferente do que era tocado na Inglaterra e nos Estados Unidos, e todas as "engrenagens" que vinham acopladas – revistas, roupas, filmes, produtos vinculados, tecnologia moderna, etc. – estavam lá.

Roberto, que estava bem atualizado com a "cartilha" do ídolo pop da época (que era universal), também foi pioneiro na utilização do soul (vide: http://outravezorei.blogspot.com/2009/11/como-roberto-carlos-trouxe-o-soul-para.html) e da música negra, num momento em que ela era extremamente influente, inclusive no "pop branco".

Essa consolidação do Brasil num universo pop foi a maior contribuição "real" para a nossa música. Depois de um tempo, ele saiu da "linha de frente", e deixou de ser criador de tendências para criar seu próprio universo, bem característico, mas aí a história é outra...

Por Alexei Michailowsky.
Adaptações: Murillo Pompermayer.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

A voz do "Rei"...


A voz "real" tem sido motivo de muita discussão. Há quem diga que ele não canta bem, que é meio fanho, que tem uma voz pequena, e por aí vai... Roberto, de fato, não tem um "vozeirão" com muita extensão, mas tem uma voz "bem educada", e, em 50 anos de carreira fonográfica, aprendeu a usar bem os recursos que tem – e não são poucos. Analisemos, então, a evolução de sua voz.

De 1959 a 1965...

Roberto emitia um timbre mais grave, pouco anasalado, aveludado... E cantava de um jeito contido, exceto por uns "uivos" nos rocks. Reparem que nos 78 RPM de Bossa Nova e no Louco por você, a voz é bem de garoto, o que é natural, já que Roberto tinha entre 18 e 21 anos.

1965...

Surge o Roberto da Jovem Guarda, adquirindo "malandragem" e atitude no cantar. Ele não mais canta de um jeito linear. Pronuncia sílabas com força, "arranhando a garganta". Incorpora, então, influências de canto falado, e o timbre se torna anasalado. O disco desse ano representa a transição. Algumas músicas ele canta do jeito "antigo"... Esperando você, por exemplo, e outras, como É papo firme, da "nova" forma.

1966-67...

Ele vai desenvolvendo a "malandragem" já mencionada na forma de cantar, e o timbre mais aveludado que usa nas músicas românticas fica mais forte e seguro.

1968...

Surge a voz "adulta" do "Rei", que consegue conciliar os timbres anasalados e aveludados. Graças às músicas mais sérias, ele mostra nuances que até então não mostrava... As canções que você fez pra mim, por exemplo. E passa a atingir extensões maiores. Além disso, "berra" como cantor negro.

1970...

Em Pra você e Astronauta, o "Rei" "inaugura" uma nova modalidade de canto. No caso, suave, contido, "ao pé do ouvido". Irá chegar ao auge disso muito em breve.

1971...


O "Rei" está maduro e no ápice do seu canto. No disco desse ano, ele usa todo o seu repertório. "Berra" em Todos estão surdos, A namorada, Só tenho um caminho... Pronuncia sua voz "definitiva" (muito melhor do que cantaria depois) em Traumas, Como dois e dois, e vai "ao pé do ouvido" em Detalhes e De tanto amor.

1972: disco importantíssimo...

Conceitual, cheio de detalhes interessantes. Ele pretende chegar ao "fundo do coração" das pessoas. E de uma forma muito íntima e conceitual. O som todo do disco é "nublado", "cinzento", como a capa... E a voz do "Rei", exceto em umas poucas canções, é extremamente "macia", "ao pé do ouvido", como ele nunca fez, e depois não voltará a fazer. Vão predominar os tons mais agudos.

1973 a 1975...

Ele está no auge da forma vocal, como em 1971. Não volta a cantar "ao pé do ouvido", mas retoma a força e os nuances em músicas como O moço velho e Além do horizonte. Seu canto é "limpo" e expressivo, vide Olha, Proposta e Você.

1976 até os dias atuais...

Surge a voz e o jeito de cantar que ele consolidou a partir daí e do qual não mais se afastou. Canta "pelo nariz", adota uma margem "confortável" de tonalidades, e não mais irá se "aventurar" por tons mais agudos, nem cantar com força como antes. Também abandonará a suavidade "ao pé do ouvido". Vai cantar sempre com vibrato, bem mais do que fazia antes. E, aos poucos, sua interpretação vai ficando mais linear, sem tantos nuances. Até hoje, e desde então, a voz "real" soa bem homogênea nas gravações, com a mesma equalização. Os "mapas" de gravação devem ter seguido um padrão, iniciado nos Estados Unidos, onde ele gravou de 1971 a 1984, e seguindo depois aqui. Como "aulas" de uso de recursos vocais, os discos de 1968 a 1975 são exemplares. Depois, o "Rei" meio que "escondeu o jogo"...

Por Alexei Michailowsky.
Adaptações: Murillo Pompermayer.